APRESENTAÇÃO

“A TERRA DE QUE A GENTE GOSTA” é expressão que nos agrada. É sentida e é profunda, e é adotada como a ideia força de “TomarOpinião”.

Pretendemos oferecer críticas construtivas e diversificadas sobre os valores, as coisas e as atualidades da nossa terra, e não só. Pretendemos criar um elemento despertador de consciências e de iniciativas de cidadania, e constituir uma referência na abordagem descomprometida desses valores, dessas coisas e dessas atualidades.

Queremos, portanto, estimular o debate, de temas e de ideias, porque acreditamos que dele podem resultar dinâmicas de cidadania, que alicercem mudanças que por certo todos aspiramos.

“TomarOpinião” será um blogue de artigos de opinião e um espaço de expressão livre e responsável, diversificada e ampla.

tomaropiniao@gmail.com


segunda-feira, 31 de outubro de 2016

COISAS E REPUBLICAS

António Lourenço dos Santos

A “Coisa Publica” seria de todos. Pelo, menos dos que assumem a responsabilidade pelo coletivo, o apelo do bem comum, o sentido da missão que é assegurar o bem-estar da comunidade, seja ela qual for: da rua, do bairro, da aldeia, da vila ou da cidade, do país ou do mundo. E que cada um toque sua viola…
Não são isentos de dificuldades, esses sentimentos.  Desde logo, porque a natureza humana não é perfeita. Bem pelo contrario, a pedra bruta prolifera e não busca, muitas das vezes, o polimento. Pena, porque então poderíamos caminhar para o mundo perfeito, da harmonia e da paz.
Mas a “coisa publica” não é tão simples quanto isso. Transformou-se em Republica, logo nos seus primórdios, na Grécia Antiga, e a (necessária?) organização da sociedade e a (inevitável?) estruturação do poder logo iniciaram a perversão da “coisa”. A autoridade do senado e o poder dos magistrados, poderão ser primeiras ilustrações disso mesmo. Teve inicio o afastamento entre a coisa publica e o resto das coisas.
Quero dizer, não parece que a “coisa publica” se possa exprimir com a naturalidade e a espontaneidade que a legitimariam, e que talvez fosse desejável.  Lá surgiram as formas de organização convenientes para regular a vida social e evitar os exageros e devassidões que poderiam advir da livre expressão da vox populi.
Recordo-me aqui de uma questão nuclear que foi colocada num exame oral da cadeira de ciência politica do professor Jorge Miranda nos bons tempos inaugurais da faculdade de ciências humanas da Universidade Católica: o anarquismo, é a ordem desorganizada ou a desordem organizada?
A republica: é a organização da voz do povo, ou é a voz do povo desorganizada?
Mas o que nos intriga são todos os que não querem participar na “coisa publica”.
É um dos inícios da degradação da “coisa publica”, é demissão dificilmente tolerável, é comodismo conveniente, é preguiça mental, é sinal de fraqueza urbana, são argumentos de falacia, é tudo menos cidadania.

Quem quiser que vista a pele.         

domingo, 23 de outubro de 2016

TOMAR É A MINHA REPÚBLICA

Carlos Trincão

Tomar é onde a calma das manhãs tem coisas que a pressa dos dias não permite descortinar. É por isso que só às vezes, quando os olhos, o acaso e a Alma se encontram num mesmo instante, vemos o que está sempre à nossa frente...
A minha cidade é uma viagem no tempo que pode começar logo de manhã, quando acordo e olho a silhueta do Castelo. Ali se guardam os antigos segredos templários; e, no Convento e em cada claustro, novas razões para uma atenção redobrada às preciosidades reconhecidas como Património Mundial, onde espreita a Janela do Capítulo, janela do mundo aberta para a cidade e para o mistério. Ou janela da Cidade a abrir caminhos ao Mundo?
Cidade-Jardim, assim também se chama, a dar a certeza de que aqui sempre a Natureza e o Homem viveram em harmonia. Dir-se-ia que as pedras monumentais, a água e as plantas conjugaram esforços para aqui fazer um lugar de sonho que também se descobre nos pormenores, nas janelas e portais, na serena presença dos antepassados, nas mãos do Povo que enchem as ruas de cor e perfume.
A cidade descobre-se logo pela manhã, ao lado do Nabão a imaginar-lhe o cheiro depois de atravessar a cidade de uma ponta à outra debaixo de um sol danado de bom que vem em força entrando de supetão pelas pessoas dentro.
O rio é um poema serpenteante quando atravessa a cidade. E é também Paz, Tranquilidade, Trabalho e Lazer. No centro, envolve a ilha do Mouchão num abraço ritmado pelo chiar melodioso da Roda árabe.
As minhas histórias do (e no) Nabão são quase mais as da vontade de as ter tido do que outra coisa. Algumas houve a bordo – ou fora de borda – daqueles botezecos de remos e aluguer. Houve outras à borda. Mas as que mais se recordam são as estórias virtuais que uma vida sempre sempre ao lado do rio foi criando: um gosto desmesurado pelo Rio, um desejo muito grande de ser parte disto tudo, uma inveja enorme das aventuras no Rio de outros mais velhos que por aqui folgaram na sua juventude.
Chamem-se-lhe socalcos no rio e a imagem é bem conseguida. Antigamente o Nabão podia muito bem ser uma sucessão de espelhos de água que cada açude de estacaria represava. Desciam o rio, alimentando as terras e as indústrias; chegavam a Tomar e continuavam a alimentar terras e indústrias; e prosseguiam depois, voltando a alimentar terras e indústrias.
Com os açudes casavam as rodas de rega, autênticas pontes ligando as águas às terras. Conta “Nini” Ferreira que “a água encaminhava-se para os canais das rodas em forte corrente. Corria e batia nas penas das rodas. Empurrava-as. A frente das penas, atados nas cintas exteriores iam os alcatruzes que mergulhavam, enchiam, subiam, despejavam nos “tabuleiros” e lá seguia a água para o “calheiro real” e, daí, por canos ou aquedutos. E, assim, chegava a água a hortas e pomares.” Ao som de bucólicas chiadeiras e rangidos das madeiras.
As terras eram – e são – férteis à beira-rio. Nem podiam queixar-se da água com que as rodas as refrescavam. E assim era. Roda após roda. Chiadeira atrás de chiadeira.
Açude após açude. Rápido após rápido. Mouchão após mouchão, ilhas de verdes e frescuras entre o rio e o canal. Como o Mouchão do centro da cidade, este agora em versão de substantivo próprio. Atravessa-se o pontão e esquece-se a urbe. Entra-se numa autêntica catedral de recolhimento a que não faltam sequer imensas colunas a suportar românticos arcos góticos de plátanos, ao mesmo tempo tecto e vitral por onde a luz se entremeia com a folhagem.
Águas de Tomar não são só as do Rio. Também o Mar nos percorre as veias desde tempos imemoriais: desde os tempos em que os Papas eram Bispos de Tomar, desde os tempos em que a igreja de Santa Maria do Olival, não apenas panteão templário, foi matriz da grande diocese que foram as terras descobertas e cujo governo espiritual era responsabilidade dos Sucessores de Pedro. Ou ainda desde aqueles tempos em que Gama, o Almirante das Índias, aqui recebeu a dignidade de Cavaleiro de Cristo directamente das mãos do próprio Rei D. Manuel.
Há até quem diga que o Tesouro dos Templários ainda aqui está escondido; outros, que o que aqui esteve foi apenas um nono desse tesouro; um nono que um cavaleiro português ao serviço do Rei Dinis recebera de Jacques de Molay, em Paris, na véspera da prisão do Mestre dos Mestres; um nono do Tesouro Templário que mais não era do que os mapas marítimos que Henrique, o Navegador e Pai dos Descobrimentos, utilizou para reencontrar o Mundo.
Mas isso são sonhos! Apesar de ser um lindo sonho pensar que a parte do Tesouro que nos coube foi o Conhecimento, não é? Aliás, beleza é o que aqui não falta: quando as mãos do Povo acariciam as matérias rudes, o resultado é sempre uma preciosidade, seja para o paladar ou para os olhos, de tal modo que a Arte de florir as ruas prossegue dentro de casa, florindo os lares com as flores da Natureza.
As mesmas flores cujas pétalas celebram Santa Iria, em Outubro: da Ponte Velha, flutuando na água, pintam-se o Nabão e a Memória com pontinhos de cor.
Flores que se repetem na Festa dos Tabuleiros, a Alma dos tomarenses, com o cheiro das flores, do pão e das espigas de trigo nos tabuleiros que vão à cabeça das raparigas vestidas de branco. Uma festa em que todas as artes e devoções se unem num imenso louvor e em que os tomarenses se unem num único e imenso abraço.
É isto que se faz pela manhã: beber a magia desta cidade, uma magia que não se entende porque apenas se sente. Magia feita de Ruas, de Mouchão, de Castelo, de Festa.
De bocados de cidade que já não existem mas ainda se recordam. Afinal, tudo é mais de sentir do que de ver.

E à noite, quando as sombras sussurram mistérios, há sempre uma luz que nos indica caminhos.

domingo, 16 de outubro de 2016

CAMPOS DE FÉRIAS / A MINHA CASA É A TUA CASA

            Carlos Trincão

O tema é República, mas prefiro “Res publica”, isto é, o que é público, a coisa pública. Daí que…
Decorreu este Verão, sob a dinâmica e eficaz coordenação da Filipa Fernandes e dos responsáveis políticos da Junta de Freguesia de Santa Maria dos Olivais e S. João Batista, através do programa JUNTANIMA, um conjunto de semanas de férias educativas e recreativas para jovens e crianças do nosso Concelho. De resto, o mesmo já se passara em anos anteriores, o que merece o meu aplauso e estímulo, se é que a minha palavra tem algum “poder” nesse campo (presunção e água-benta…).
Esta questão é-me particularmente grata pois que, trabalhando com crianças, reconheço a importância e a valia desta iniciativa.
Atrevo-me, portanto, a repescar um texto meu de há 10 anos, apresentado na Assembleia Municipal de Tomar, sobre matéria convergente, PRINCIPALMENTE, para dar mais lenha para a Filipa carregar. as ideias nunca estão a mais e podendo haver maneira de as aproveitar, caso interessem, e juntar vontades, todos ganhamos.
Aqui fica, portanto, o meu contributo sobre esta matéria:

Em 31 de Março do corrente [estávamos em 2006], no âmbito do debate sobre o Regulamento das Férias Desportivas, o Bloco de Esquerda produziu uma intervenção na qual sistematizou um conjunto de ideias susceptíveis de corporizarem o embrião de um processo de criação de Campos de Férias Residenciais em Tomar, intervenção essa que suscitou acenos de simpatia por parte de outros membros desta Assembleia.
Afirmámos, então, que voltaríamos a esta temática em altura que o permitisse fazer de modo mais formal, o que acontece agora.
Tendo consciência de que não compete a esta Assembleia intervir neste aspecto, é, todavia, também, nossa obrigação aconselhar ou sugerir ao Executivo as opções que considerarmos adequadas para o enriquecimento do nosso Concelho, pelo que se sistematiza, de novo, aquele conjunto de sugestões:

1 – Criação de Campos de Férias residenciais susceptíveis de acolher jovens de outros pontos do país e do estrangeiro, salvaguardando desde logo uma quota para residentes no Concelho.

2 – Definição das actividades por áreas de intervenção, temáticas ou generalistas (Desporto, Música, Artes Plásticas, Teatro, Acampamento,...) monitoradas por Associações e Clubes locais.

3 – Concretização destes campos com a intervenção de Mecenas e outros (Ministérios – ou Secretarias de Estado – da Educação, Cultura, Desporto e Juventude, Emprego e Segurança Social).

4 – Possibilidade de participação nestes campos de férias de jovens do Concelho oriundos de famílias de menores recursos financeiros em condições de apoio especiais.

5 – Criação de quotas em todos os programas para filhos de cidadãos tomarenses emigrados.

6 – Divulgação deste programa em cidades com afinidades histórico-culturais com Tomar (Viseu ou Santarém, por exemplo), laços de cooperação, como a Rede Europeia das Cidades dos Descobrimentos (Lamego, Castelo Branco, Coimbra, Porto, Lagos, Lisboa, entre outras) ou as Associações de Municípios da Ordem de Cister e com Centro Histórico.

7 – Promoção deste programa em cidades com que Tomar mantém geminações (Haddera, Vincennes), actividade anterior, como a Rede Europeia das Cidades dos Descobrimentos (com cidades em Espanha, Bélgica, Itália e Holanda), Pontedera e Pisa (Festival Sete Sóis Sete Luas), Galway (Irlanda, Rede das Cidades Médias Europeias) e com as cidades do Projecto Les Fêtes du Soleil (Siena em Itália, Beersheva em Israel, Le Kef na Tunísia, ilha de Gozo – Malta e Versailles).

8 – Criação, com os responsáveis políticos das cidades referidas, de condições para que
jovens tomarenses, ou filhos de tomarenses emigrados, possam aí ter acesso a programas similares.

9 – Lançamento do programa de férias “A minha família é a tua família, a tua família é a minha família”, criando uma rede recíproca de famílias acolhedoras de jovens de outros países.

10 – Criação de um projecto paralelo de promoção de Tomar junto das outras cidades a par do projecto de divulgação dos dois anteriores: Campos de Férias e Famílias Acolhedoras.

Assim, e fazendo a “ponte” entre uma proposta e uma recomendação, como por vezes é sugerido, proponho que esta Assembleia recomende ao Executivo a apreciação dos 10 pontos anteriormente sistematizados.

Tomar, 20 de Abril de 2006

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Panorama Cultural Tomarense


Património ou as "Coisas complicadas da Terra Tomarense"

Rui Ferreira


Tomar tem a barriga cheia de património, digo eu. Infelizmente os estômagos cheios provocam indigestões.
Consultando os canhenhos da história, na nossa terra não se tem sabido cuidar e valorizar o património.
Logo nos inícios do século XX, Tomar viu desaparecer uma ruína romana, visitada anualmente por milhares de pessoas, onde inclusivamente chegou a funcionar um pequeno museu.
Hoje em dia, Cardais não passa de um topónimo e os vestígios da sua vila rústica, - casa senhorial romana de proprietários agrícolas -, desapareceram para sempre sob as hortas e o casario moderno.

Após um século de natural e desejado desenvolvimento, as coisitas antigas que por aqui sobrevivem contribuem directa e inequivocamente para a indústria do momento: o Turismo. 

Tenho a certeza que quem nos visita e se detém alguns dias na cidade, não prescinde de visitar o centro histórico onde infelizmente a degradação dos edifícios, a falta de ordenamento das infraestruturas públicas e, sejamos francos, alguma ignorância, contribuem para uma paisagem edificada medíocre. 

A mediocridade com que temos cuidado, e continuamos a cuidar, o nosso património radica, na minha opinião, na nossa falta de formação cultural. Existe uma endémica indiferença pela coisa histórica. 

Por exemplo, há anos manifestei a minha indignação face ao abandono a que a Charolinha estava votada.
Cheguei mesmo a redigir um artigo para um jornal local. O minúsculo edifício do século XVI, escondido lá longe dentro da Mata dos Sete Montes, era como um caderno diário para malfeitores que nem escrever sabiam. Soube ainda que as frestas das suas janelas terão servido de alvo, em competições de pontaria... 

Congratulo-me agora com o restauro que aquele singular edifício sofreu. Graças às vontades do Município de Tomar, do Instituto Politécnico de Tomar e ainda de docentes e alunos do Curso de Conservação e Restauro do IPT, conseguiu-se travar a degradação da Charolinha e acabar com a vergonha que o seu estado nos causava.

Antes da intervenção era este o aspecto da Charolinha.




Após cerca de 500 horas de trabalho de uma equipa do IPT, com apoio logístico do Município de Tomar e do ICN.




Esta casa de fresco onde os frades da Ordem de Cristo se juntavam para, talvez, contar anedotas sobre o Frei António de Lisboa, está agora à nossa disposição mas também à nossa responsabilidade.
Visitem-na.

Fotos: Rosa Magalhães e Alunos do IPT